Mistério resolvido | Cientistas identificam vulcão que causou resfriamento global há quase 200 anos

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Publicado em 11/01/25 às 14:17

Por quase dois séculos, um evento climático extremo ocorrido entre 1831 e 1833 intrigou cientistas em todo o mundo. Na época, relatos apontavam que o Sol apresentava cores incomuns — azul, roxo e até verde — e as temperaturas despencaram cerca de 1°C, causando verões gelados, chuvas intensas e até nevascas fora de época. Agora, uma equipe de pesquisadores da Universidade de St Andrews, na Escócia, finalmente desvendou o mistério: a erupção que desencadeou essa anomalia climática foi do vulcão Zavaritskii, localizado em uma ilha remota no Extremo Oriente russo.

A descoberta foi possível graças à análise de amostras de gelo coletadas em regiões polares. Os cientistas identificaram fragmentos de cinzas vulcânicas nas camadas de gelo e, ao comparar a composição química desses resíduos com depósitos encontrados nas Ilhas Curilas — um arquipélago localizado entre o Japão e a Rússia —, encontraram uma “impressão digital” perfeita.

Foi um verdadeiro momento de eureka, afirmou o Dr. Will Hutchison, principal autor do estudo.

Quando comparamos as cinzas do gelo com as do vulcão Zavaritskii, percebemos que os números eram idênticos. Essa descoberta é o resultado de anos de colaboração com colegas do Japão e da Rússia, que nos enviaram amostras coletadas dessas áreas remotas.

Um verão que parecia inverno

Os impactos da erupção vulcânica de 1831 foram sentidos em várias partes do mundo. Na Europa, o compositor alemão Felix Mendelssohn relatou, durante uma viagem pelos Alpes, que o verão daquele ano era tão frio quanto o inverno. “Choveu a noite toda e a manhã inteira. Já há neve profunda nas montanhas próximas”, escreveu ele em uma carta.

Em agosto do mesmo ano, jornais de várias regiões — como China, Caribe, Estados Unidos e Europa — relataram que o Sol tinha assumido cores estranhas, resultado das partículas de cinzas e gases vulcânicos suspensos na atmosfera. Esses resíduos bloquearam parte da luz solar e alteraram a forma como a luz se dispersava, criando o fenômeno óptico incomum.

Os cientistas já especulavam que a causa desse evento poderia ter sido uma erupção vulcânica, mas nunca haviam conseguido identificar o local exato. Alguns acreditavam que o culpado poderia ser o vulcão Babuyan Claro, nas Filipinas, ou a erupção de uma ilha vulcânica temporária chamada Ferdinandea, perto da Sicília, mas nenhuma dessas hipóteses se confirmou.

Com a nova descoberta, ficou claro que o responsável foi o vulcão Zavaritskii, cuja erupção foi altamente explosiva e lançou uma imensa quantidade de cinzas e gases na atmosfera, provocando um impacto climático global.

Como vulcões afetam o clima da Terra

Erupções vulcânicas têm o poder de alterar o clima do planeta, principalmente quando lançam grandes quantidades de dióxido de enxofre na atmosfera. Esse gás pode refletir a luz solar de volta ao espaço, reduzindo temporariamente a temperatura da Terra.

Um exemplo recente foi a erupção do Monte Pinatubo, nas Filipinas, em 1991. Considerada uma das maiores do século XX, a erupção lançou uma nuvem gigante de dióxido de enxofre que reduziu a temperatura global em aproximadamente 0,5°C durante até três anos.

A erupção do Monte Pinatubo em 1991 é considerada uma das maiores do século XX.

De acordo com os pesquisadores, se uma erupção semelhante à de 1831 ocorresse nos dias de hoje, o mundo enfrentaria grandes desafios.

Um evento como esse causaria um grande impacto social e econômico. Haveria queda na produção agrícola, interrupções nos voos e mudanças climáticas abruptas, afirmou Hutchison.

Além disso, ele destacou a dificuldade de prever erupções de grande magnitude.

Existem muitos vulcões em áreas remotas que não são monitorados constantemente. Isso mostra o quanto ainda estamos vulneráveis a eventos naturais imprevisíveis.

O que podemos aprender com o passado?

A descoberta do vulcão Zavaritskii é um lembrete importante de que desastres naturais podem ter impactos globais duradouros. Enquanto a erupção de 1831 provocou um resfriamento temporário, eventos desse tipo também podem contribuir para o aquecimento global, dependendo da quantidade de gases emitidos.

Os cientistas afirmam que o monitoramento contínuo de vulcões ativos é essencial para entender e mitigar os riscos. Eles também destacam a necessidade de cooperação internacional para responder rapidamente a uma erupção de grande magnitude.

As mudanças climáticas já estão desafiando nossas sociedades. Precisamos nos preparar para lidar com um evento vulcânico de grandes proporções, que certamente acontecerá novamente. A questão é: estamos prontos?, concluiu Hutchison.

O estudo sobre a descoberta foi publicado na conceituada revista científica Proceedings of the National Academy of Sciences e promete abrir novas portas para pesquisas sobre o impacto de vulcões no clima global.

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